chamar nomes

December 13, 2011 Angola, Diário de viagem 0 Comments

Não foi a estes moto-taxistas que perguntei. Viram-me passar com a máquina na mão e pediram para ‘tirar’. Fui passear pela cidade num final de tarde e resolvi montar a lente de 50mm na 5D para me habituar a fotografar com ela. Eu não sabia, quando comecei a investir nisto da fotografia e de filmar em DSLR, mas é preciso conhecer as lentes que se tem, conhecer o comportamento delas com a luz, a cor, as texturas, e isso requer prática. A 50mm dá-me muito trabalho e estas fotografias estão fraquitas, mas não é isso que interessa agora.

Os expatriados têm frequentemente uma postura paternalista e condescendente quando viajam, trabalham ou visitam países de culturas diferentes. Pelo menos em África têm. Acham engraçadas coisas que para os locais são uma banalidade. É natural, porque quando chegamos a um país diferente, com culturas diferentes, reparamos nas diferenças mais evidentes e focamo-nos nelas. Achamos engraçado, muitas vezes. Pretendemos conhecer, ouvimos a explicação e seguimos o nosso caminho protegido de expatriado, repetindo a explicação, contando e toda a gente que há ali fora umas coisas muito engraçadas que se chamam assim e funcionam daquela maneira. E repetimos, e rimos, e achamos engraçado. ‘Eles’ são assim, ‘eles’ fazem aquilo. São tão engraçados.

Muitos guias turísticos têm este problema. Ler livros sobre Portugal feitos por estrangeiros costuma ser divertido. As invenções são imensas, os estereótipos ridículos, os avisos de perigos que desconhecíamos soam estranhos. Parece que não conhecemos o país em que vivemos nem a cidade onde moramos. No guia de Moçambique que comprei quando lá fui em Abril tinha coisas como “Nas praias de Catembe muitos casais de namorados escondem-se nos barcos de pesca pousados sobre o areal e se tentar fotografar alguém o mais provável é elas fugirem a correr pela praia.” Não garanto a exactidão da frase, mas a ideia era esta e não tive de caricaturar. Só me lembro do Tintim no Congo quando leio coisas destas. Claro que quando fui a Catembe não encontrei casais nos barcos e a maior dificuldade que tive foi de me vir embora porque toda a gente queria ser fotografada.

Voltemos às motas. Dentro da oferta de transportes públicos existente, as motas são o que mais se aproxima do serviço de táxi porta-a-porta que conhecemos e custam quase sempre 100Kz. Têm a vantagem em relação aos táxis colectivos, aquelas carrinhas Toyota Hyace azuis e brancas aqui conhecidas por ‘iáces’, de nos levar a locais onde não existem outras ofertas de transportes e de serem mais rápidas porque não há paragens. A desvantagem é que é um bocadinho perigoso. Não há capacete e ter óculos dá jeito por causa da poeira no ar. Às vezes é preciso pedir para irem um pouco mais devagar. Uma vez apanhei um moto-taxista que já devia ter bebido qualquer coisa e que nos ia espetando ao passar por cima de um buraco no asfalto, mas foi a única vez até agora. De resto, sempre em segurança, sempre eficaz e rápido. Uma destas noites apanhei uma mota para uma esplanada onde ia beber uma cerveja com pessoal amigo. Olha, que nome dão a este serviço? Moto-táxi, mas costumamos dizer só mota. E a quem conduz a mota? Moto-taxista. Mas há quem chame kukapata também, não é? É, mas não gostamos. A explicação do nome não condiz com a que me tinham contado, parece que é qualquer coisa como “aquele que mete as mãos nos bolsos dos clientes”, mas não tenho a certeza da certeza do moto-taxista. Em todo o caso, percebi que é um nome tão carinhoso de chamar como em Lisboa tratar um taxista por ‘fogareiro’. Já experimentei, numa discussão de trânsito. Não ajudou, lembro-me.

Outros enganos que tenho reparado têm a ver com os tais ‘iáces’. ‘Iáce’ é o nome da carrinha, vem de Toyota Hyace. Mas as pessoas não andam nem vão de ‘iáce’ para os seus destinos. Vão de táxi. Mais uma vez, adaptando a confusão para Lisboa, é como se chamássemos Volvo aos autocarros. E ninguém diz vou de Volvo para Benfica.