São Paulo – dia 1

September 23, 2013 Brasil, Diário de viagem 0 Comments

Glauber conduz o táxi pelas congestionadas ruas de São Paulo, levando, com uma paciência trancendental, passageiros de uma ponta a outra da cidade.

Quem chega de ônibus à Barra Funda, um dos terminais de camionagem aonde chegam os vários suburbanos (nós chegámos de Sorocaba, a 150km do centro de São Paulo, mas há quem faça esta viagem de duas horas e meia, duas vezes por dia), tem como opção de continuação de viagem pegar o metrô, subir noutro ônibus urbano, ou chamar um táxi. Carregados com malas de roupa para um mês, mochilas com equipamento, tripés e sacos com o que deixou entretanto de caber nas malas, a 3ª opção parece a mais confortável, dado o cansaço ainda por dissolver das viagens e jet lags, e a falta de vontade para enfrentar sem conhecimento prévio os transportes colectivos de uma das maiores metrópoles do mundo. No guichet de uma das várias empresas de táxis existentes apresentam-nos duas modalidades de pagamento, por taxímetro ou com preço fixo. 36 reais, preço fixo, parece-nos mais seguro do que arriscar ver números a saltar de 30 em 30 segundos, estagnados num presídio de lata e borracha que se move aos soluços pelas ruas e avenidas. Glauber chega na viatura, apresenta-se, e ajuda-nos a colocar as malas na bagageira. A mochila com o equipamento vai comigo. Sinto-me seguro, gosto de contrariar os estigmas e alarmismos de insegurança que nos emprenham os ouvidos na véspera da viagem, mas que las hay, las hay.

MG_0024

MG_0025

A morada indicava um número par da Avenida Paulista, a uns 10km da Barra Funda. O táxi entra pelo lado dos ímpares. Há correspondência de dezenas, ou mesmo centenas, nos dois lados da avenida, pergunto. A resposta é insegura e pedimos para mudar para o sentido inverso. Liga-se o GPS, entra-se por duas ou três ruas secundárias, lentamente, à velocidade possível com a ocupação das vias tão saturadas de carros como de peões, até chegar ao cruzamento que dá acesso à inversão de marcha. O número da porta atira-nos para lá do final da Avenida Paulista, uma impossibilidade quântica, mas são milhares de números de porta, saltos às vezes de centenas de uma quadra para outra. Entre a fé relativamente sólida da certeza da indicação tirada do email e o cepticismo educado e paciente de Glauber chegou-se a um desempate telefónico com a nossa anfitriã. Fica no edifício do Riviera, um bar fashion para a high society aberto na véspera, no cruzamento com a rua da Consolação. É mesmo ali, 100 metros mais à frente, mas inacessível de carro indo a direito pela existência de um passeio que anuncia o fim da avenida Paulista e a faz desaguar na rua da Conceição. Glauber não se importa de ir dar a volta lá abaixo, garante com uma simpatia tão calma como condescendente, estranha para quem nos guia na modalidade de preço fixado à partida. Cinco minutos, pensamos nós, meia hora, na verdade. A rua da Conceição desce com 4 faixas para cada lado, todas congestionadas, e a virada fica bem lá mais em baixo. Na espera, ficamos a saber que Glauber passa 15 horas por dia sentado naquele lugar que lhe faz doer as pernas, chega a casa ao fim da noite e se deita na cama para acordar pouco depois, ainda de noite, para ganhar 500 reais por dia. Por semana, paga 1100 reais pelo aluguer do táxi. Feitas as contas, com um dia de descanso, sobram 4900 reais por semana que ficam reduzidos a metade com as despesas de combustível, revisões do carro e eventuais arranjos necessários. Ao câmbio actual, a 30 reais o euro, dá cerca de 800€ por semana, ainda assim um óptimo ordenado em São Paulo, mas com apenas 9 horas, das 24 que tem um dia, para dormir, viver um pouco e esperar que as dores nas pernas passem.

MG_0030

MG_0044