agricultura

December 12, 2011 Angola, Diário de viagem 0 Comments

Uma das coisas que mais me impressionou quando atravessei de carro a fronteira de Moçambique com a África do Sul foi a mudança radical da paisagem. Apesar da terra ser a mesma, do clima ser idêntico, onde em Moçambique havia hectare atrás de hectare de terreno cultivável não aproveitado ou com dispersas iniciativas de agricultura de subsistência, na África do Sul, imediatamente a seguir à fronteira, a viagem passa a ser marcada pelo ritmo visual imposto por centenas de explorações agrícolas industrializadas. A vista no google maps é igualmente impressionante. A linha branca é a fronteira, a Oeste está a África do Sul, a Este fica Moçambique.

Estas diferenças podem até não representar um aumento da riqueza e acesso a bens de primeira necessidade para a generalidade da população, mas mostram-nos como é possível aproveitar ou desperdiçar o potencial natural de um país. Numa sociedade onde a causa pública fosse posta à frente do bem privado, seria possível implementar agricultura industrial que erradicasse a fome e gerasse riqueza com exportações.

A comparação de quatro países que me estão próximos, dá resultados interessantes: Moçambique e África do Sul, só porque esta ideia de comparação nasceu daí, Portugal e Angola, por me interessarem muito estes assuntos desde que cá cheguei. O google tem uma ferramenta comparativa muito útil para estas coisas.

Em primeiro lugar, a percentagem das contribuições da sectores primário, secundário e terciário no PIB.

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Cruzando estes dados com as definições das várias revoluções industriais, assim superficialmente, dá ideia que em Moçambique os progressos tecnológicos da primeira não chegaram ainda à maioria da população.

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Os valores altíssimos de Angola no gráfico do contributo do sector secundário para o PIB devem-se sobretudo à exportação de crude. Já agora, refira-se que Angola é exportador de crude, mas importador de petróleo e derivados, por existir apenas uma refinaria em todo o país, obsoleta. Está a ser construída uma no Lobito que se prevê estar em funcionamento em 2012.

No agregador de informação wikipédia pode ler-se:

Despite its abundant natural resources, output per capita is among the world’s lowest. Subsistence agriculture provides the main livelihood for 85% of the population. Oil production and the supporting activities are vital to the economy, contributing about 45% to GDP and 90% of exports. Growth is almost entirely driven by rising oil production which surpassed 1.4 million barrels per day (220×103 m3/d) in late-2005 and which is expected to grow to 2 million barrels per day (320×103 m3/d) by 2007. Control of the oil industry is consolidated in Sonangol Group, a conglomerate which is owned by the Angolan government. With revenues booming from oil exports, the government has started to implement ambitious development programs in building roads and other basic infrastructure for the nation.

Ainda sobre a agricultura, a TDS escreve:

In the last decade of the colonial period, Angola was a major African agricultural exporter. Because of severe wartime conditions, including the massive dislocation of rural people and the extensive laying of landmines throughout the countryside, agricultural activities came to a near standstill, and the country now imports over half of its food. Small-scale agricultural production has increased several-fold over the last 5 years due to demining efforts, infrastructure improvements, and the ability of returnees and internally displaced persons (IDPs) to return safely to agricultural areas, yet production of most crops remains below 1974 levels. Some efforts at commercial agricultural recovery have gone forward, notably in fisheries and tropical fruits, but most of the country’s vast potential remains untapped. Recently proposed land reform laws attempt to reconcile overlapping traditional land use rights, colonial-era land claims, and recent land grants to facilitate significant commercial agricultural development. However, the lack of clear title to land tracts and burdensome registration process in Angola continues to be a significant impediment to foreign investment in the agriculture sector.

Ao nível do sector terciário, Portugal apresenta-se com 75% da receita do PIB, dentro da média dos países desenvolvidos, enquanto Angola atinge apenas 28%.

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O Produto Interno Bruto da África do Sul é de longe o maior destes 4 países, com Moçambique a apresentar valores muito baixos.

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Para se calcular o PIB per capita é necessário dividir o PIB pela população. O rendimento da África do Sul revela-se assim insuficiente para toda a população.

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A área cultivada não nos dá apenas por si a conhecer o nível de desenvolvimento da agricultura. Ainda por cima aqui compara-se percentagens de território e não valores absolutos. Mas espreitem a comparação entre países europeus, aqui.

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Depois há uma quantidade grande de outros dados de comparação. Não sei se consigo ler alguma coisa com os dados acima, apesar de que escrevi. O que sei é que ando a pé pelos bairros e vou falando com as pessoas, pergunto aos miúdos que idade têm e fico espantado quando oiço doze, treze, mesmo catorze, em crianças com aspecto franzino de quem não tem mais de sete. Falo com pessoal doutras ONGs que por cá anda há meia dúzia de anos e que têm no discurso já algum desencanto com o país. Dizem-me que o primeiro a comer é o pai, a seguir a mãe, e seguem-se os filhos a começar pelo mais velho. Dizem-me que há crianças que comem uma refeição por dia. Dizem-me que muitos pais não mudam comportamentos, por mais alertados que estejam para os efeitos da sub-nutrição, e entre uma Cuca gelada e uma refeição para o filho mais novo optam pela primeira. A que juntam depois a segunda, a terceira, a quarta.

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Mas há quem pense neste assunto em Angola e diga em voz alta o que devia ser óbvio para todos. A notícia é da Rádio Ecclesia, sediada em Luanda.

“Por sua vez o Bispo emérito de Benguela mostrou-se preocupado com o elevado número de crianças fora do sistema normal de ensino. Dom Óscar Braga explicou que Angola deve apostar na formação dos angolanos apesar das riquezas que o país possui.

Para o Bispo emérito de Benguela, Angola não pode continuar a comprar os produtos agrícolas de outros países. Dom Óscar Braga propôs um plano de agricultura nacional a fim de se reduzirem as importações.”