Dia 2 | Gonçalo – Fariza

As boas referências da pousada da juventude, a necessidade de ficar de manhã a trabalhar e a vontade de fazer menos quilómetros do que no dia anterior, fazem-me marcar Fariza, uma pequena localidade a poucos quilómetros da fronteira, como destino no GPS. Preguiça minha, por um lado, de não querer abrir e desdobrar o mapa, por outro um incorrigível vício por gadgets e fascínio pela inteligência artificial.

A utilidade do GPS é evidente em cidade, com ruas, travessas e avenidas a sobrepor-se sem dar tempo para olhar o mapa a quem não conhece aquele emaranhado. Por outro lado, pode ter o mesmo efeito hipnótico dos smartphones, fazendo-nos perder contacto com o envolvente.

Paragem em Freixedas para receber uma dose de cafeína.

Paragem em Freixedas para receber uma dose de cafeína.

O entusiasmo tecnológico vence, ainda assim. Decido atravessar o Parque Natural do Douro Internacional. O caminho segue por Guarda, Pinhel, faço uma paragem em Freixedas para café e tirar uma fotografia, paro novamente para comer um pêssego, fazer um telefonema, tirar mais fotografias. A estrada continua sensual, torneando as encostas.

Dia 2. Douro Internacional. Aposto que a vossa sogra não vos mima assim tão bem!

Dia 2. Douro Internacional. Aposto que a vossa sogra não vos mima assim tão bem!

Aproxima-se Barca d’Alva. Recordo uma viagem de comboio que fiz com a minha mãe, há muitos anos, numa semana de férias. Como qualquer criança de 5 anos, passei por todos os estados de espírito possíveis de ter quando se está numa carruagem fechado a ver o mundo passar. A minha mãe conta muito uma birra que fiz a certa altura em que anunciei fazer greve de fome, provavelmente inspirado pelo Bobby Sands. Acho que não durou muito tempo, derrotada por uma perna de frango assado que havia para o almoço. A viagem terminou nesta estação. Lembro-me de molhar os pés no Douro, uns metros abaixo da linha, do silêncio do vale e do carinho da minha mãe. Tenho pena de não poder voltar a fazer esta viagem de comboio. A tecnocracia dos últimos 30 anos de governação matou muito mais do que a economia do país. Num país governado por gente com mais cultura, teria sido mantida e aproveitada para turismo, no mínimo, sem descurar as populações que dela precisam.

Estação de comboio de Barca d’Alva

A sair da estação, o GPS manda-me para trás. Estranho, tento perceber a indicação. Há uma estrada que segue imediatamente para Espanha. Hesito, não quero sair já de Portugal, ainda com a energia de há três décadas a ressoar-me na memória. Por outro lado, quero chegar a Fariza ainda de dia, e “se o GPS me manda ir por ali é porque é melhor ir por ali”.

Depósito atestado

Barragem de Almendra

Só quando chego à pousada vazia, e vejo no mapa o percurso que fiz, percebo que fui vítima de outra forma de tecnocracia. Desviei-me do Parque Natural que queria fazer e entrei na paisagem tipicamente entediante da planície espanhola. Irritado, percebo que a culpa não é da máquina, mas da minha estupidez e preguiça em pegar no mapa e ver o plano de uma forma mais global e macroscópica. Um erro apenas com prejuízo próprio, ao menos.

Dia 2. 223,9km.

Gastos com deslocação e estadia:
9€ pousada da juventude
18.40€ gasolina (12.97L)

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Total Km: 679,6km
Total Gasolina: 39.78€
Total Estadia: 9€

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