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Fico sempre comovido com a capacidade que a minha mãe tem de se maravilhar com as tonalidades quentes do por do sol ou com o caleidoscópio de reflexos que a luz faz no rio, quando passeamos ao longo do Tejo ou nos debruçamos na janela da sala de casa dela. “É sempre diferente, já viste?”, diz-me ainda hoje, com o mesmo brilho com que dizia e mostrava as coisas, ao caminharmos de mão dada junto ao rio desde o Cais do Sodré até Alcântara, quando eu tinha quatro anos.
Há uns dias contou-me do período que passou na prisão, dos 19 aos 23 anos, por pertencer ao MUD Juvenil, durante a ditadura fascista que atrasou o país irremediavelmente. Disse-me que tinham uma hora de recreio por dia, a única hora que podiam apanhar algum sol, e que um dia viu uma plantinha crescer entre dois tijolos do muro do pátio. Trouxe o pé de planta para a cela e pô-lo num vaso. Entretinha-se a ver as pequenas folhas nascer, acompanhando o crescimento milímetro a milímetro, nas 23 horas que a obrigavam a ficar fechada na cela, um dia depois do outro, depois do outro, depois do outro. Eram esses pequenos milagres de vida que lhe mantinham a sanidade mental.
Já conhecia a história, já a tinha ouvido mais do que uma vez, mas oiço-a sempre de novo como se fosse a primeira, e só me apetece abraçar e beijar muito uma pessoa que conta uma história destas.
A minha mãe faz hoje 81 anos e continua menina, maravilhada com o milagre do Universo.
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